Em Sapé, recursos do Fundef foram desviados nos últimos dias da gestão de Roberto Feliciano. Sapé e mais 5 municípios receberam elevados valores do antigo Fundef em 2020
Foto de capa: Promotora Juliana Couto
O Ministério Público da Paraíba quer garantir que os recursos advindos dos precatórios do antigo Fundef sejam utilizados exclusivamente em ações de manutenção e desenvolvimento do ensino, nos termos do artigo 70 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), como forma de minimizar, sobretudo, os impactos derivados da pandemia no resguardo do direito à educação universal e de qualidade. Para tanto, os Centros de Apoio Operacional (CAOs), às Promotorias da Educação e às Promotorias do Patrimônio Público estão encaminhando um material para os promotores de Justiça que atuam nessas áreas para que instaurem um procedimento administrativo e proponham um termo de ajustamento de conduta aos gestores municipais.
O objetivo é fiscalizar e acompanhar os recursos recebidos pelos municípios em 2019 e 2020 e os que estejam para receber como também pactuar na obrigação de incluir na legislação orçamentária municipal, em rubrica específica, os valores auferidos a títulos de precatórios do Fundef, cuja destinação será despesas consideradas de manutenção e desenvolvimento do ensino da educação básica pública, firmando-se ainda a obrigação de elaboração de um cronograma de despesas e um plano de aplicação de recursos compatíveis com os objetivos dos planos estadual e municipal de educação.
O Fundef vigorou de 1998 a 2006, quando foi substituído pelo Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos profissionais da Educação). Em 1999, o Ministério Público Federal em São Paulo (MPF/SP) ajuizou uma ação contra a União ao constatar que ela estaria repassando valores inferiores ao que seria devido. Em 2015, o Supremo Tribunal Federal confirmou a sentença, determinando a União a repassar aos municípios lesados, a diferença dos valores devidos.
O material foi encaminhado pelos coordenadores dos CAOs da Educação e do Patrimônio Público, respectivamente, os promotores de Justiça Juliana Couto Ramos e Reynaldo Di Lorenzo Serpa.
De acordo com a promotora Juliana Couto, um levantamento feito pelos CAOs aponta elevados valores recebidos por sete municípios em 2019 (Bom Sucesso, Cajazeirinhas, Curral de Cima, Imaculada, Marcação, Riachão e Riachão do Bacamarte) e seis municípios em 2020 (Brejo do Cruz, Catingueira, Damião, Igaracy, Mogeiro e Sapé), com projeções inclusive do que foi desembolsado e do quanto remanesce em conta bancária, registrando que há ainda recursos por vir, em proveito de outros municípios paraibanos. O levantamento também foi encaminhado aos promotores.
Ainda conforme a promotora de Justiça, o material produzido pelos CAOs é inspirado na iniciativa das 44ª e 15ª Promotorias de Justiça de Maceió que firmaram um Termo de Ajustamento de Conduta com o gestor público municipal de modo a vincular a destinação dos recursos dos precatórios do Fundef exclusivamente em despesas consideradas como de manutenção e desenvolvimento do ensino para a educação básica pública. além disso, o TAC instituiu a obrigação de o gestor municipal não efetuar o pagamento de qualquer tipo de remuneração aos profissionais do magistério da educação básica, até que sobrevenha decisão definitiva do STF admitindo ou não esse tipo de subvinculação.
Monitoramento
Os Centros de Apoio orientam ainda que os promotores de Justiça velem para que o gestor público municipal não aplique os recursos decorrentes do pagamento a menor de valores a título de complementação ao Fundef em pagamento de qualquer tipo de remuneração aos profissionais do magistério da educação básica, até que sobrevenha decisão definitiva do STF admitindo ou não esse tipo de subvinculação (60%), sobretudo diante do entendimento contrário consolidado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE/PB).
Além disso, os CAOS sugerem o monitoramento, quando da elaboração e implementação do plano de aplicação dos recursos, das previsões quanto à execução de obras e serviços diagnosticados como prioritários, a partir das especificidades locais, podendo se valer da plataforma Indicadores de Desempenho de Gasto Público da Paraíba (IDGPB) I, desenvolvida pelo TCE-PB, que tem por propósito disseminar informações relevantes sobre o desempenho dos setores educacionais para auxiliar na formulação de políticas públicas no Estado.
Os CAOs orientam ainda que sejam fiscalizados, através do Sistema Sagres do TCE/PB, os recursos recebidos a título de complementação ao Fundef, que devem estar depositados em uma conta bancária específica para esses valores de precatórios (diferente da conta geral do Fundeb), a fim de garantir-lhe rastreabilidade e utilização exclusiva na destinação.
Em Sapé. Desvio milionário
Um acordo judicial celebrado entre o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Sapé (Sindservs) e a Prefeitura resultou em regras para o rateio do precatório oriundo do extinto Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). O acordo previa a destinação de percentuais para rateio com professores e pessoal de apoio da educação, pagamento de honorários advocatícios, imposto de renda, previdência e beneficiamento de prédios e equipamentos públicos voltados à educação do município. O acordo foi assinado em 02 de dezembro de 2016 e homologado em 03 de junho de 2020.
O município recebeu R$ 11,8 milhões no dia 11 de outubro do ano passado, dos quais R$ 7,2 milhões foram transferidos para o Bradesco para o rateio com professores e pessoal de apoio. O saldo remanescente deveria ter sido destinado ao beneficiamento de prédios e equipamentos voltados à educação, mas além dessa finalidade, a Prefeitura de Sapé realizaou indevidamente diversas transferências para as contas do Programa de Desenvolvimento do Município (Prodem), Prev-Sapé e para do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
Todas essas transferências realizadas da conta específica do Fundef são ilegais, já que a legislação proíbe pagamentos que não tenham relação com a manutenção do ensino. Como exemplo dos desvios temos o Prodem, um programa voltado ao empreendedorismo, que é financiado através de uma contribuição social de 1,5%, incidente sobre todos os valores de pagamentos realizados pela Prefeitura relativos ao fornecimento de bens, serviços e contratação de obras. Somente no mês de dezembro de 2020, a Prefeitura de Sapé fez nove transferências diretamente para o Prodem. A legislação determina que os recursos do Fundef sejam depositados e movimentados em conta específica, não sendo permitidas transferências para outras contas do município.
Outros desvios constatados pela investigação do Portal GPS ocorreram nos dias 30/10/2020, quando foi transferido o valor de R$ 832.413,28, para o Prev-Sapé, e em 30/12/2020, no apagar das luzes do final do mandato, com a transferência de R$ 920 mil para a conta do FPM. Apenas nessas duas transferências, a Educação do Município foi lesada em mais de R$ 1,7 milhão, configurando o uso indevido do precatório do Fundef para fins diversos à manutenção do ensino.
Antes mesmo da destinação dos recursos do Fundef, o município deveria ter elaborado o “plano de aplicação dos recursos” compatível com o Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/2014), com os objetivos básicos das instituições educacionais (artigo 70, caput, da Lei 9.394/1996), e com os respectivos planos estaduais e municiais de educação, em linguagem clara, com informações precisas e os valores envolvidos em cada ação/despesa planejada, dando-lhe ampla divulgação ao Conselho do Fundeb, ao Poder Legislativo, ao Tribunal de Contas do Estado e à comunidade diretamente envolvida (diretores de escolas, professores, estudantes e pais) conforme o Acórdão 2866/2018-TCU-Plenário. A Prefeitura de Sapé não elaborou o Plano e ainda utilizou sem critérios os recursos recebidos do Fundef.
O Tribunal de Contas da União (TCU) também veda a destinação de valores dos precatórios do Fundef para o pagamento de honorários advocatícios. Nos termos dos artigos 2º, da Lei 9.424/1996, 2º, 21 e 23, da Lei 11.494/2007, os recursos vinculados à área da educação estão gravados com essa específica finalidade constitucional e apenas podem custear atividades de educação. Constitui, portanto, ato ilegal, ilegítimo e antieconômico o pagamento de quaisquer honorários de advogados com tais recursos, ou a destinação desses valores para outras áreas da ação municipal, mesmo que de relevante interesse público.
Os dados bancários obtidos pelo Portal GPS constam do Processo nº 01891/21 do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB) e, diante da constatação de transferências ilegais, utilização dos recursos sem o “plano de aplicação dos recursos” e utilização dos valores para fins distintos da manutenção do ensino, cabe aos órgãos fiscalizadores como o Conselho Municipal do Fundeb, Câmara Municipal de Sapé, Ministério Público, TCU e TCE-PB promoverem as devidas auditorias e adotarem as medidas legais.
Da Redação do Portal GPS com dados do TCE-PB e do MPPB.
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